CINE ESTREIA: "Não Sou Nada - The Nothingness Club", de Edgar Pêra
Realização: Edgar Pêra
Argumento: Luísa Costa Gomes, Edgar Pêra (baseado na obra de Fernando Pessoa)
Fotografia: Jorge Quintela
Música: Jorge Prendas
Produção: Bando à Parte (Rodrigo Areias)
Elenco: Miguel Borges, Victoria Guerra, Albano Jerónimo, Vítor Correia, Miguel Nunes, Paulo Calatré, Marco Paiva, Paulo Pires, Miguel Moreira, António Durães, Laurence Alliston-Greiner (Reino Unido), Dinis Gomes, Valdemar Santos, Keith Davis, Jorge Prendas, Carlos Correia, Rafael Pereira, Tiago Miranda, Viriato Morais, José Ribeiro, Paulo Furtado, Nuno Vassouras, Nuno Preto, Bernardo Santo Tirso, Alexandrino Silva, Rui Mário Silva, Nuno Pacheco, Paulo Silva, Bernardo Sarmento, Ali Ahmed, José Dias, João Delgado Lourenço, Luís Almeida, Pedro Bernardino, Samuel Coelho, António Matos, Eduardo Brito, David Almeida, Leonor Keil, Marina Albuquerque, Ivan Roberto, Edgar Pêra
Sinopse: Thriller psicológico que decorre dentro da cabeça de Fernando Pessoa (Miguel Borges). No seu Clube do Nada, habitado por heterónimos, o poeta consegue concretizar todos os seus sonhos em vida. Mas a entrada em cena de uma mulher sofisticada (Victoria Guerra), muito diferente da Ofélia do mundo real, vem destabilizar o Clube, enquanto o ultrajante heterónimo vanguardista, Álvaro de Campos (Albano Jerónimo), disputa a autoridade de Pessoa de forma violenta.
Fernando Pessoa nasceu em 1888, em Lisboa, aí morreu em 1935, e poucas vezes deixou a cidade e os seus arredores em adulto, mas passou nove anos da sua infância em Durban, na colónia britânica da África do Sul, onde o seu padrasto era o cônsul Português. Pessoa, que tinha cinco anos quando o seu pai morreu de tuberculose, tornou-se um rapaz tímido e cheio de imaginação e um estudante brilhante. Pouco depois de completar 17 anos, voltou a Lisboa para entrar no Curso Superior de Letras, que abandonou depois de dois anos, sem ter feito um único exame. Preferiu estudar por sua própria conta na Biblioteca Nacional, onde leu livros de filosofia, de religião, de sociologia e de literatura (portuguesa em particular) a fim de completar e expandir a educação tradicional inglesa que recebera na África do Sul. A sua produção de poesia e de prosa em inglês foi intensa durante este período, e, por volta de 1910, já escrevia também muito em português. Publicou o seu primeiro ensaio de crítica literária em 1912, o primeiro texto de prosa criativa (um trecho do Livro do Desassossego) em 1913, e os primeiros poemas de adulto em 1914. Vivendo por vezes com parentes, outras vezes em quartos alugados, Pessoa ganhava a vida fazendo traduções ocasionais e redacção de cartas em inglês e francês para firmas portuguesas com negócios no estrangeiro. Embora solitário por natureza, com uma vida social limitada e quase sem vida amorosa, foi um líder activo da corrente modernista em Portugal, na década de 1910, e ele próprio inventou alguns movimentos, entre os quais um «Interseccionismo» de inspiração cubista e um estridente e semi-futurista «Sensacionismo». Pessoa manteve-se afastado das luzes da ribalta, exercendo a sua influência, todavia, através da escrita e das tertúlias com algumas das mais notáveis figuras literárias portuguesas. Respeitado em Lisboa como intelectual e como poeta, publicou regularmente o seu trabalho em revistas, algumas das quais ajudou a fundar e a dirigir, mas o seu génio literário só foi plenamente reconhecido após a sua morte. No entanto, Pessoa estava convicto do próprio génio e vivia em função da sua escrita. Embora não tivesse pressa em publicar, tinha planos grandiosos para edições da sua obra completa em português e inglês e, ao que parece, guardou a quase totalidade daquilo que escreveu.
Em 1920, a mãe de Pessoa, após a morte do segundo marido, deixou a África do Sul de regresso a Lisboa. Pessoa alugou um andar para a família reunida – ele, a mãe, a meia-irmã e os dois meios-irmãos – na Rua Coelho da Rocha, n.º 16, naquela que é hoje a Casa Fernando Pessoa. Foi aí que Pessoa passou os últimos quinze anos da sua vida – convivendo muito com a mãe, que morreu em 1925, e com a meia-irmã, o cunhado e os dois filhos do casal (os meios-irmãos de Pessoa emigraram para a Inglaterra), embora também passasse longas temporadas em casa sozinho. Familiares de Pessoa descreveram-no como afectuoso e bem humorado, mas muito reservado. Ninguém fazia ideia de quão imenso e variado era o universo literário acumulado na grande arca onde ia guardando os seus escritos ao longo dos anos. O conteúdo dessa arca – que hoje constitui o Espólio de Pessoa na Biblioteca Nacional de Lisboa – compreende mais de 25 mil folhas com poesia, peças de teatro, contos, filosofia, crítica literária, traduções, teoria linguística, textos políticos, cartas astrológicas e outros textos sortidos, tanto dactilografados como escritos ou rabiscados ilegivelmente à mão, em português, inglês e francês. Pessoa escrevia em cadernos de notas, em folhas soltas, no verso de cartas, em anúncios e panfletos, no papel timbrado das firmas para as quais trabalhava e dos cafés que frequentava, em sobrescritos, em sobras de papel e nas margens dos seus textos antigos. Para aumentar a confusão, escreveu sob dezenas de nomes, uma prática – ou compulsão – que começou na infância. Chamou heterónimos aos mais importantes destes «outros eus», dotando-os de biografias, características físicas, personalidades, visões políticas, atitudes religiosas e actividades literárias próprias. Algumas das mais memoráveis obras de Pessoa escritas em português foram por ele atribuídas aos três principais heterónimos poéticos – Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos – e ao «semi-heterónimo» Bernardo Soares, enquanto muitos poemas e alguma prosa em inglês foram assinados por Alexander Search e Charles Robert Anon. Jean Seul, o solitário heterónimo francês, era ensaísta. Os muitos outros alter-egos de Pessoa incluem tradutores, escritores de contos, um crítico literário inglês, um astrólogo, um filósofo, um frade e um nobre infeliz que se suicidou. Havia até um seu «outro eu» feminino: uma pobre corcunda com tuberculose chamada Maria José, perdidamente enamorada de um serralheiro que passava pela janela onde ela sempre estava, olhando e sonhando.
Hoje, mais de oitenta anos após a morte de Pessoa, o seu vasto mundo literário ainda não está completamente inventariado pelos estudiosos e uma importante parte das suas obras em prosa continua à espera de ser publicada. (Richard Zenith, tradutor e investigador pessoano)
Edgar Pêra nasceu a 19 de Novembro de 1960, em Lisboa. Ingressou na Escola de Cinema do Conservatório Nacional (actual Escola Superior de Teatro e Cinema) em 1980, especializando-se na área de montagem. Realizador de filmes neuro-punks e telediscos e autor de Banda Desenhada, estreou em 1990 no Fantasporto a sua primeira curta-metragem - Reproduta Interdita. Edgar Pêra já fez mais de 100 filmes para cinema, televisão, teatro, dança, cine-concertos, galerias, Internet e outros meios.
Filmografia:
The Nothingness Club - Não Sou Nada (2023)
Caminhos Magnétykos (2019)
O Homem-Pikante - Diálogos kom Pimenta (documentário, 2019)
Delírio em Las Vedras (2017)
O Espectador Espantado (documentário, 2016)
Lisbon Revisited (documentário, 2016)
A Caverna (curta-metragem, 2015)
Virados do Avesso (2014)
3x3D (segmento "CineSapiens") (2013)
CineSapiens (curta-metragem, 2013)
One Way or Another, Reflections of a Psycho Killer (curta-metragem, 2012)
O Barão (2011)
Crime Abismo Azul Remorso Físico (curta-metragem, 2009)
Rio Turvo (2007)
Arquitectura Documental (curta-metragem documental, 2007)
Punk Is Not Daddy (2007)
Movimentos Perpétuos: Cine-Tributo a Carlos Paredes (documentário, 2006)
És a Nossa Fé (curta-metragem, 2004)
Sudwestern (2004)
Os Homens-Toupeira (2003)
88 (telefilme, 2002)
O Homem-Teatro (2001)
A Janela (Maryalva Mix) (2001)
25 de Abril - Uma Aventura para a Demokracya (curta-metragem documental, 2000)
Lisboa-boa 345DT (curta-metragem, 2000)
Esquinas Agudas (curta-metragem, 1999)
Portugal Ilimitado (curta-metragem, 1998)
A Janela não é a Paisagem (1997)
A Konspiração dos Mil Tímpanos (1996)
Os Túneis da Realidade (curta-metragem, 1996)
O Dia do Músico (curta-metragem, 1996)
O Mundo Desbotado (curta-metragem, 1995)
Visões! Equações! Radiações! (1995)
Manual de Evasão (1994)
SWK4 (curta-metragem, 1993)
A Cidade de Cassiano (curta-metragem documental, 1991)
Matadouro (curta-metragem, 1991)
Reproduta Interdita (curta-metragem, 1990)