Rosa Feldman nasceu no Brasil, filha de emigrantes judeus da Polónia, na década de vinte do último século, e cresceu e viveu parte da sua vida em duas comunidades que se cruzavam: a da judeidade ídiche e a do ideal comunista. Casou com um escritor português que conheceu num evento político no Leste Europeu e que com ela se mudou para o Brasil, onde já viviam outros intelectuais refugiados da ditadura portuguesa, até à mudança definitiva para Portugal. A vida de Rosa percorre a história do século XX, do antissemitismo europeu vivido pelos seus pais e antepassados, dos fascismos, dos ideais socialistas e comunistas. Percorre também a história das pressões a que os judeus foram sujeitos e das opções com que se confrontaram: sionismo, integração nas sociedades nacionais ou internacionalismo cosmopolita? Ethel Feldman, filha de Rosa, e Miguel Vale de Almeida, antropólogo, juntaram-se neste projecto colaborativo com Rosa Feldman nos seus últimos anos de vida, bem como com uma rede de familiares em Portugal e no Brasil, construindo um trabalho que hibridiza a autobiografia, a memória familiar, a biografia e a antropologia, bem como registos de escrita diferentes. Os autores acreditam que a história de vida de uma pessoa é simultaneamente única e semelhante às dos outros humanos; que ela é tanto da própria pessoa quanto das relações em que a pessoa se constitui; que os contextos sociais e históricos nos moldam, mesmo não nos determinando, e que, ainda assim, nos construímos apesar deles. Para Miguel Vale de Almeida, foi uma via para fazer o que se havia proposto, a experimentação de novas formas de fazer antropologia. Para Ethel Feldman, foi uma forma de (re)visitar a sua narrativa de identidade familiar. E, para Rosa, foi a oportunidade de se contar – aquilo que, afinal, todos desejamos fazer.