ISTO É PORTUGAL! - Microalgas Necton
Origem: Belamandil (Olhão)
Em busca do tesouro verde que cresce no leito salgado da Ria Formosa, João Navalho, Vítor Verdelho e Inácio do Valle acabaram por esbarrar em ouro branco. Incubado o embrião da Necton, na Escola Superior de Biotecnologia da Universidade Católica do Porto, foi mais a sul que, em 1997, os três sócios encontraram o seu lugar ao sol, numa velha salina de Olhão.
Em apenas três hectares, começaram a produzir a Dunaliella Salina, uma microalga para extracção de betacaroteno, um antioxidante rico em proteína A. Até que um estudo publicado pela FDA - a organização governamental responsável pelo controlo alimentar e de medicamentos nos EUA -, contestando os alegados benefícios deste micronutriente, veio ditar que fosse o sal a passar à mesa dos negócios. Baptizada em nome dos antigos trabalhadores da salina, assim nasceu a marca Marnoto, que leva sal marinho tradicional (grosso e fino) e flor de sal ao circuito gourmet mundial e às principais cadeias de hipermercados nacionais. Porém, sem nunca abandonar por completo a produção de microalgas para a indústria cosmética - só por encomenda -, o que os agora 23 hectares de salinas fazem multiplicar são as microalgas que hoje alimentam pequenos peixes... e amanhã talvez alimentem a produção de biocombustíveis.
Apesar de microscópicas no tamanho, não lhes falta grandeza no nome. Nannochloropsis oculata é como se chama a espécie de microalgas que grassa nas linhas de produção da Necton, no lugar de Belamandil, concelho de Olhão. Saídas das mãos dos biólogos marinhos e engenheiros químicos e físicos desta PME algarvia, as microalgas têm como destino alimentar, nos seus primeiros 22 dias de vida, as larvas de peixes nascidas em aquacultura. Para criar os «recém-nascidos» nas maternidades de peixe e oceanários, basta adicionar as soluções concentradas de microalgas PhytoBloom a água do mar, na razão de um mililitro por litro.
Pioneira europeia a lançar a onda das soluções concentradas de microalgas para aplicação em aquacultura, a empresa portuguesa canaliza 99% da sua produção para lá da fronteira: Espanha, Itália e Grécia lideram a lista de destinos de exportação. Em solo - ou água - português, as microalgas com selo PhytoBloom dão de comer a camarões para aquário, comercializados por uma congénere algarvia, e a peixes-palhaço para aquário (celebrizados pelo protagonista do filme de animação À Procura de Nemo), de uma marca lisboeta.
A cultura é feita em fotobiorreactores, equipamentos que funcionam como «fermentadores que expõem a cultura à luz», explica João Navalho, administrador da companhia. Na receita que vai dar origem ao alimento das pequenas larvas de peixe, a luz solar é mesmo o principal ingrediente para fazer crescer as microalgas, logo seguida do dióxido de carbono (CO2), comprado em Portugal. Estes dois elementos são fundamentais para que as pequenas plantas marinhas completem o processo de fotossíntese, de modo a ganhar massa e libertar oxigénio. Finalmente, há que juntar água do mar captada nas salinas e alguns nutrientes, como nitratos, fosfatos, magnésio, ferro e estrôncio, também de origem nacional.
Dentro dos seis fotobiorreactores, numa fase inicial, as microalgas estão concentradas num depósito. Depois, a cultura «viaja» por tubos transparentes, num trajecto que pode estender-se por 200 metros, até chegar à zona onde a fotossíntese acontece, antes de regressar novamente ao depósito. É aí que está instalada a central de controlo: aí se regula a temperatura, o pH da água e a concentração da própria cultura. No entanto, «ao contrário da agricultura tradicional», sublinha o responsável, «em que há uma época de semear e outra de colher», na Necton colhem-se microalgas diariamente. «Todos os dias "sangramos" o reactor, colhemos as microalgas que diluímos com água, para que, no dia seguinte, tudo recomece», acrescenta.
A fasquia de produção de uma tonelada de microalgas por ano, que ainda não satisfaz os administradores da Necton, pode ser ultrapassada em breve, garantem. «Estamos a crescer. Agora que o investimento no sal já foi feito, 2013 será dedicado ao investimento nas algas». O saber que a empresa foi cultivando juntamente com as microalgas é outra mais-valia para o negócio. «Quando alguém no mundo procura uma determinada microalga rara, vem sempre ter connosco, o que nos permite fazer trabalhos interessantes e bem remunerados», adianta o biólogo marinho de formação. Exemplo disso foram os 100 quilos de microalgas encomendados pela multinacional Exxon Mobil para testar a qualidade de óleos para produzir biodiesel.
150 metros cúbicos é a dimensão do maior fotobiorreactor mundial de produção de microalgas, pronto a inaugurar no final deste ano, na unidade industrial de Cibra Pataias, no concelho de Alcobaça, onde a Secil esventra a terra para fabricar cimento branco. O dióxido de carbono que a cimenteira tem de sobra na factura de emissões de gases poluidores é matéria-prima e também dinheiro em caixa para a cultura de microalgas. Ao invés de comprar C02 no mercado, a A4F - spin-out tecnológica da Necton, da qual a empresa-mãe é accionista maioritária - vai buscá-lo à indústria, que, assim, vê diminuir as suas emissões. Contando com outro gigante industrial luso, a A4F avançou, também, com o projecto Algafuel, que conquistou o Prémio BES Inovação 2006. Em cima da mesa, chegou a estar a produção de biomassa e biocombustíveis a partir das microalgas, na refinaria da Galp, em Sines. Embora a parceria com a petrolífera portuguesa tenha caído por terra, o projecto continua em marcha, graças ao financiamento da União Europeia.
(retirado do artigo "Portugal faz bem - À flor do mar" publicado na edição nº 1022 da revista VISÃO)